OS PALACETES DO ANHANGABAÚ
Palco das maiores transformações do centro de São Paulo, o Vale do Anhangabaú, outrora chácara de chá e Parque do Anhangabaú, estabeleceu-se numa área limitada pela Rua Líbero Badaró e a Rua Formosa, onde entre elas existia o córrego do Anhangabaú, há muitos anos canalizado.
A Rua Líbero Badaró era o limite daquilo que se chamou de “Centro velho”, enquanto que a Rua Formosa, era o inicio da área chamada de “Centro novo”, e entre eles o Vale que também passou por vários alterações ao longo dos anos.
Mas antes de se tornar uma Sala de visitas da cidade, no vale prosperavam pomares e hortas, plantações de verduras, flores, chá, e está fase agrícola não estava destinada a durar muito. Depois da construção do teatro Municipal no lado do Centro novo, era deplorável para as autoridades o efeito que produzia a vista do fundo das casas da Rua Formosa e no outro lado da Rua Libero Badaró, com seus objetos domésticos e varais carregados de roupa. Assim estipulou-se que as construções passariam a ter fachada de frente para o Vale, sendo que as pequenas casas seriam demolidas em 1913.
Durante a prefeitura do Barão de Duprat (1911 a 1914), foram encarregados os urbanistas franceses Joseph Bouvard e Cochet, de planejar o ajardinamento do futuro Parque do Anhangabaú, que viria a ser então a “Sala de visitas da cidade” . Concluída a urbanização do local, quem melhor retrata toda aquela beleza, dos jardins, das aléias floridas, dos recantos sossegados, das fontes e gramados são os cartões postais e pinturas feitos na época.
O belga Claude Lévi-Strauss descreveu o Vale em 1935:
“Desemboca-se a beira da ravina do Rio Anhangabaú, atravessando por uma ponte que é uma das principais artérias da cidade. A baixada é ocupada por um parque no gosto inglês: canteiros ornados de estátuas e quiosques, enquanto na vertical dos dois taludes elevam-se os principais edifícios: o teatro Municipal, o Hotel Esplanada, o Automóvel Club, os escritórios da companhia canadense que fornece a luz e os transportes. Suas massas heteróclitas se afrontam numa desordem imóvel. Estes edifícios em batalha evocam grandes rebanhos de mamíferos reunidos à tarde em torno de um ponto d´água por alguns instantes hesitantes e imóveis”
Mas a beleza foi efêmera, pois o vale foi cedendo a aplicações práticas, que viriam a promover todas as transformações que ali se desenvolveram com o passar do tempo.
No processo da primeira grande urbanização iniciada pelo Barão de Duprat, três grandes construções floreceram primariamente que foram os Palacetes Prates. A razão deste nome no conjunto de edificações foi porque Eduardo da Silva Prates, nomeado o primeiro conde de Prates (SP 8/11/1860 a 22/03/1928) era um negociante paulista, brasileiro, dedicado aos ramos imobiliário, bancário e férreo, e era um dos maiores proprietários da parte central da cidade, a tal ponto que tanto a municipalidade quanto o governo estadual, encontraram nele uma alavanca para a realização do Plano Bulevar. Desta maneira o Conde acabou por desempenhar grande contribuição com aquelas autoridades de São Paulo na realização do Plano, que era a modificação do ambiente e melhorias das edificações da Rua Líbero Badaró, sendo que sua maior contribuição foi nas negociações para que o solar dos Barões de Itapetininga (uma imensa chácara), existente nesta rua, fosse doada para o município e assim transformar-se no Parque do Anhangabaú.
Ele também ajudava financeiramente muitas instituições, tais como a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, um orfanato chamado Cristóvão Colombo, a Igreja Santo Antônio, localizada na Praça do Patriarca (é hoje um dos marcos da praça) e o Liceu Sagrado Coração de Jesus. O Conde Prates sempre desdenhou qualquer prêmio político que lhe fosse oferecido por benemerência. Faleceu em São Paulo a 22 de março de 1928.

Nota 1: Vista do Parque do Anhangabaú com belos jardins, e o destaque conjunto de Palacetes do Conde de Prates. Por trás destes palacetes está a Rua Líbero Badaró. No Palacete 1, funcionou a Câmara Municipal e a Prefeitura, no palacete 2, o sofisticado Automóvel Club fundado em 1908 e considerado “um clube chique” e um dos mais belos palácios existentes em São Paulo. Entre os dois está o Edifício Sampaio Moreira de 14 andares, considerado o primeiro arranha-céu de SP.
Para a direita, vê-se a praça do Patriarca, com a famosa Mappin Stores , o primeiro viaduto do chá (ainda de metal ) e o Palacete 3 onde funcionou o Hotel de La Rotisserie Sporstman, e em seus dias finais o jornal Diário da Noite. No seu local seria construído o atual Edifício Matarazzo, atual sede da prefeitura de São Paulo.
Os dois prédios, dito gêmeos ao lado esquerdo do viaduto do chá foram projetados pelo engenheiro agrônomo baiano Samuel das Neves e por seu filho, o arquiteto formado na Universidade da Filadélfia Cristiano das Neves (o mesmo da Estação Sorocabana/Júlio Prestes), e seu proprietário era certamente o Conde de Prates.

Rara imagem da construção dos palacetes do Conde de Prates na década de 10 do século passado. Eram os prédios mais suntuosos da cidade na década de 1910, e sediaram diversas instituições importantes.

No final da década de 20 e inicio dos anos 30, o Palacete Prates (1) ganhou a companhia do Edifício do Clube Comercial que inaugurado em 1930, possuía várias lojas e escritórios, além de salões de baile. Também instalou-se ali a Bolsa de Mercadorias. Esta foi a ultima construção que definiu o limite do Parque do Anhangabaú, no lado da cidade chamado de “centro velho”. Nota-se a esquerda a construção do famoso edifício Martinelli, já superando em altura o edifício Sampaio Moreira (à direita). No outro lado deste parque (centro novo) estaria então o Teatro Municipal, o Hotel Esplanada e mais tarde o edifício Alexandre Mackenzie (São Paulo Light & Power Co.).
 
Acima as construções numa panorâmica da Rua Líbero Badaró em 1935: logo abaixo os “fundos” do Clube Comercial, a seguir os palacetes gêmeos 1 e 2, e ao fundo na parte superior da imagem o Hotel La Rotisserie e o viaduto do Chá. |